Reynaldo Valinho Álvarez: "Cada livro é uma nova viagem"

Entrevista concedida a Leda Miranda, editora do jornal Poesia Viva)

Reynaldo Valinho Alvarez (Rio de Janeiro, 1931) publicou 37 livros de poesia, ficção, ensaio e literatura infanto-juvenil, além de participar de dezenas de obras coletivas. Ganhou numerosos prêmios, entre eles o Jabuti (poesia), da Câmara Brasileira do Livro, em 1998, o Golfinho de Ouro 2002 (obra completa), do Conselho Estadual de Cultura do Rio de Janeiro e o Camaiore Internacional de Poesia, na Itália, em 1999. Traduzido para o sueco, o italiano, o espanhol, o francês, o corso, o galego, o persa e o macedônio. Colaborou na imprensa. Representou a poesia brasileira em festivais na Suécia, Macedônia, Canadá e Espanha. Dirigiu entidades culturais e faz parte do PEN Clube do Brasil, da Academia Carioca de Letras e do Sindicato dos Escritores do Estado do Rio de Janeiro.

Leda Miranda - Para fazer poesia é preciso dominar as regras da poética?

Reynaldo Valinho  - Pode-se fazer poesia espontânea e ingênua, como se faz pintura naïve ou música popular, em oposição à pintura de técnica elaborada ou à música erudita. A língua também tem o registro coloquial e a norma culta. Para fazer poesia no padrão culto, é necessário ler os grandes poetas e estudar não só as regras da poética mas também as normas do idioma em que se escreve e ainda muito mais, ao longo da vida. Tudo depende do tipo de poesia que se deseja escrever e do nível de exigência requerido.

LM - No seu processo de poetar, a criatividade irrompe como dom que você acolhe, ou é primordialmente labor, já que você revela "paixão pela artesania"?

RV - A criatividade que irrompe como dom" é apenas a centelha que deflagra o incêndio. Se a matéria atingida pela centelha não for altamente combustível, o fogo logo se apaga. Os dois elementos devem caminhar juntos, num casamento perfeito: o dom e a capacidade técnica de quem o recebe.

LM - A poesia de hoje seguindo o experimentalismo, desvincula-se da poética?

RV - Para ser bom experimentador, é preciso ter um ponto de partida, que é a tradição e um amplo conhecimento do que já se escreveu e do que se está escrevendo no âmbito da poesia. Toda inovação e toda renovação partem de algo que já existe. "No princípio era o Verbo." Não o caos ou o nada. Pode-se melhorar, mas não reinventar a roda.

LM - Como você reconhece a poeticidade do texto dito poético?

RV - A poeticidade do texto dito poético é reconhecida mediante a entrega profunda do leitor e a sua interação mental e emocional com o texto lido. Acredito que o alarido das apresentações espetaculares não seja propiciatório desse encontro. Ao contrário, penso que o silêncio, a solidão e a freqüência com que os grandes autores ajudam nessa prospecção.

LM - A faca pelo fio é definitivamente um livro representativo do seu fazer poético, ou apenas indica algumas manifestações do seu trabalho que sempre se renova?

RV - Cada livro é uma nova viagem ao mundo das palavras, embora o autor seja o mesmo, com seus temas, suas angústias, suas obsessões. Cada um é representativo, talvez, não de todas, mas de algumas características do estilo do autor.

LM -Se você escreve em tantos gêneros literários, ensaio crítico, ficção, literatura infantil, como se dá a "hora da poesia"?

RV - A "hora da poesia" é a predominante nesse concerto de natureza textual. É uma questão de preferência quase inata pelo gênero. A poesia é a forma de expressão pessoal mais freqüente e vigorosa em minha biografia.

LM - A voz do poeta que grita violências urbanas, injustiças, contradições chega a ter repercussão no mundo social?

RV - Não tem nenhuma repercussão. Mas o poeta continuará clamando "de profundis", até que a "indesejada das gentes" arrebate sua voz. Não se grita contra o mal, a crueldade, a dor e o sofrimento porque se tem a certeza de vencê-los. O brado nasce da impossibilidade de aceitá-los, mesmo quando eles são os aparentes triunfadores no mundo real em que se vive. Não cabe ao poeta apoiá-los e, por isso, seguirá protestando, mesmo que na forma de um gemido.



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